quarta-feira, 2 de novembro de 2016

Homework for November 7: Watchmen comparison

Next class we will discuss the final writing assignment, which is a comparative study between two cultural artefacts (one of them necessarily of popular culture). To try out, and considering what was said by Rui Zink and what the following vídeo expresses about the constrast between Watchmen the graphic novel and Watchmen the movie (with which you may agree or disagree), choose na angle from which to comment on similiarities and dissimilarites of both objects. Ex: alternative history; gender portrayal....


Alternatively, compare the "Tales of the Black Freighter" (a comics within the graphic novel universe of Watchmen, starting chpater 3, "The Judge of All the Earth", p. 2), with the main storyline of Watchen

8 comentários:

  1. Existe uma número muito grande de paralelismos entre os acontecimentos de Watchmen e a banda desenhada "The Tales of the Black Freighter", do mais macro ao mais microscópico.
    Em termos gerais, existem muitas vezes paralelismos entre as relações amorosas nas duas narrativas. No capítulo III, da página 3 à página 23, é estabelecida uma relação entre a incapacidade do náufrago de amar a estátua de madeira da proa do seu navio como esta o "ama" a ele, e a incapacidade de Dr. Manhattan amar Laurie como esta o ama a ele; entre a mágoa do náufrago perante a morte da família, e a mágoa de Dr. Mahnattan perante ser abandonado por Laurie; entre o desamparo que o náufrago imagina que a sua família estará a sentir em relação ao desaparecimento dele, e o desamparo de Laurie perante o desaparecimento de Dr. Manhattan. Na página 3 do capítulo VIII, o náufrago indaga-se acerca do paradeiro da sua família, se estarão mortos ou vivos, enquanto Bernie fala da sua falecida mulher, e afirma estar feliz por ela já não estar viva para testemunhar os acontecimentos daquela época. Na página 9 do capítulo XI, Josephine ("Joey") discute com a sua namorada Aline, afirmando "(...)I wanna go to bed with you and I wanna be straight and I wanna be dead!", enquanto o náufrago se pergunta "How had I reached this appalling position, with love, only love, as my guide?".
    Existem também semelhanças gerais entre ambas as narrativas: da mesma forma que o náufrago se sente impotente, incapaz de impedir a tripulação do Black Freighter de magoar a sua família, os super-heróis sentem-se impotentes, incapazes de impedirem este assassino misterioso de matar os seus companheiros (páginas 24 e 25 do capítulo III); tal como o náufrago, num estado de desespero perante o caos da existência, jura vingança e mata um casal inocente, a multidão de jovens em torno de Bernie, enraivecidos pela aparente impunibilidade dos super-heróis, decidem vingar-se matando o velho (e inocente) Nite Owl (página 25-28 do capítulo VIII e página 12, 13 e 23 do capítulo X); assim como Nite Owl, na página 22 do capítulo X, afirma que "some nice straightforward brutality" seria "like coming home", o náufrago declara "I was home" na página seguinte.
    Também um dos grandes temas na narrativa central de Watchmen é o tema principal do "Tales of the Black Freighter". No capítulo XI, o náufrago rende-se finalmente à tripulação do Black Freighter e ao seu "feitiço", enquanto que Malcom, o ex-psiquiatra de Rorschach, perde a sua mulher Gloria para sempre ao insistir em ajudar Josephine e Aline, mostrando-se rendido à sua profissão, e consumido por ela. O tema do homem que confronta a escuridão e acaba consumido por ela é predominante ao longo da obra, desde Rorschach, ao Comedian, a Ozymandias - todos consumidos pelas suas respectivas escuridões.
    As semelhanças entre as narrativas chegam até, em várias ocasiões, ao mais ínfimo pormenor. Um exemplo disto é a página 12 do capítulo V:
    - "This whole bloody mess, it gives me a funny feelin' inside" / "There was a gull in my stomach"
    - "I mean, world war three, it's a nightmare" / "I'd swallowed too much birdflesh. I'd swallowed too much horror"
    - "You watch the financial pages. Those guys, they're gonna make a killing" / "Above, scavangers wheeled hungrily"
    - "Everybody escapin' into comic books and T.V.!" / "The gulls slaughterhouse chorus afforded no distraction from my nausea"
    - "I mean, all this, it could all be gone" / " This sudden confrontation with mortality"
    - "It's our curse. We see every damned connection. Every damned link" / "His eyes, his nose, his cheeks seemed individually familiar, but mercifully I could not piece them together"
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  2. +

    Assim que o leitor se apercebe da existência de paralelismos entre as narrativas, o "Tales of the Black Freighter" oferece-lhe também presságios de acontecimentos futuros, desde o assassínio da mulher do náufrago pelas mãos do próprio náufrago (página 6, capítulo XI), que prevê a explosão violenta de Josephine contra Aline (página 23, capítulo XI), até aos vários presságios do massacre de Nova Iorque: "We talked together, my rotted fellows and I..." (página 13, capítulo VIII), "Davidstown lay sleeping, little dreaming what approached" (página 23, capítulo X), "Closer, it came. Closer" (página 20, capítulo XI), e "The end." (página 23, capítulo XI).
    Penso ser também possível identificar duas referências à Guerra Fria nesta narrativa paralela: "East, across the night seas. East, borne on the naked backs of murdered men." (página 9, capítulo V) e "In the foam about my ankles, two worlds lay ended." (página 13, capítulo X) - sendo que esta última citação é seguida pela fala de Bernie "Maybe today, maybe tomorrow, but soon for sure" (referente ao eclodir do confronto final).

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  3. Existem várias alterações na adaptação cinematográfica deste título, desde a propositada exclusão da desconstrução dos personagens para os tornar menos humanos e reais em função de os tornar mais heroicos, que seria o maior foco na BD, os heróis fundamentalmente humanos e com falhas. Estes heróis tiveram a sua personalidade alterada: Dr. Manhattan verifica-se extremamente distante e sem empatia face à raça humana logo desde inicio, ao contrário do desapego progressivo mostrado na banda-desenhada; Veidt aparece sempre como um vilão, como close-ups e música que levanta suspeitas sobre as intenções do mesmo, levando mesmo a acreditar que ele é um sociopata, quando no original ele tem boas intenções, mas que se vê obrigado a praticar o mal por um bem maior; Nite Owl não tem tanta profundidade, e no filme não conseguimos ter uma perceção tão grande do desenvolvimento emocional dele; Silk Spectre ao contrário da mulher decidida e forte da banda-desenhada, passou a uma mulher mais fraca e não faz força pelos seus ideais; Rorschach também sofreu alterações embora a sua personalidade tenha ficado intacta, principalmente as personagens que ele assassina, principalmente o homem que raptou e matou a menina de 6 anos, quem Rorschach apenas algemou à salamandra e ofereceu um cutelo para se salvar.
    O próprio filme retrata os cenários que mais nos deviam de chocar como recorrentes, quando na visual novel somos progressivamente preparados sensitiva e emocionalmente para o choque final. Mas a verdade é que a adaptação ronda tanto a violência gratuita que quando chegamos ao final e se dá a destruição de Nova Iorque e presenciamos milhões de morte não nos sentimos chocados, e quem ainda consegue sentir choque não será algo tão palpável e intenso como quando estamos a ler a banda-desenhada.
    A banda sonora é em certos momentos satírica e propositadamente faz pouco do momento em questão, a meu ver (ex: cena de guerra no Vietnam/movimento “anti-masks”/a primeira noite de Laurie e Dan).
    Penso que a adaptação tenha deixado bastante a desejar. Para 3 horas e meia o esforço, por muito que tenha sido, não foi bem dirigido. Foi dada atenção a momentos que não deveriam de ter tido tanta atenção e outros tantos que poderiam ter tido um melhor desenvolvimento e nem sequer apareceram na adaptação em filme.

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  4. “Watchmen” apresenta algumas diferenças relevantes no que diz respeito à adaptação fílmica. Na minha perspectiva, uma adaptação fílmica de qualquer tipo de texto, é uma obra de arte completamente diferente e independente e, portanto, sujeito a qualquer alteração que o realizador assim decidir. Tendo esta premissa em conta, seria de esperar que o filme não fizesse “jus” à banda desenhada, no entanto, caso o realizador seja engenhoso o suficiente, pode conseguir uma dimensão diferente, mas interessante do mesmo assunto. É de esperar que desiluda muitos dos leitores de Alan Moore, uma vez que, segundo o mesmo, a banda desenhada é o único meio de contar esta história, tendo sido, por isso, o meio utilizado para tal. A adaptação fílmica encontra-se sempre obrigada a algumas omissões, uma vez que é impossível contar com todos os pormenores, além de que, tende a procurar atrair audiências em massa, portanto serve-se do sensacionalismo na maioria das vezes.
    As maiores diferenças que saltam à vista após a leitura e o visionamento de “Watchmen” são: a super-dimensão dos poderes dos heróis, o que, na minha opinião, perde um pouco o propósito da história inicial de Moore, que seria representar seres humanos comuns que decidem tornar-se super-heróis, não tendo, portanto, qualquer força extra-humana; os “Tales of the Black Freighter”, algo com bastante relevância na BD, é completamente omitido na versão fílmica; o background das personagens, dos heróis é demasiado simplificado. Na BD os seus passados são bastante descritos, o que nos ajuda, muitas vezes, a interpretar o porquê dos seus comportamentos atuais (como acontece com Rorschach, por exemplo); a própria personagem de Night Owl não apresenta uma dimensão tão humana no filme, ao passo que, na BD este fala acerca de problemas comuns ao ser humano, é uma personagem vulnerável, com defeitos (o que permite uma identificação do leitor com o mesmo); o humor acerca do merchandising parece-me que se perde um pouco no filme; o confronto de Silk Spectre com o Comedian não acontece na versão fílmica; outra falha, na minha opinião, é o facto de Night Owl não assistir à morte de Rorschach na BD e no filme, provavelmente para jogar com o sensacionalismo e a audiência, este acaba por assitir à morte.


    Beatriz Ourique

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  5. (parte 1)
    Não tenho, à partida, qualquer problema com a adaptação cinematográfica de obras literárias ou outras. Uma boa parte dos filmes que vemos são adaptações de livros – boas ou más, que acrescentam ou não elementos, que são interessantes ou indiferentes, sérias ou vocacionadas para o entretenimento. A discussão deve ser essa, partindo sempre da ideia de que a forma altera o conteúdo.
    No entanto, a adaptação cinematográfica de Watchmen, de Alan Moore e Dave Gibbons, acaba por simplificar a obra ao ponto de uma certa irrelevância. Em parte, poderá dever-se à incapacidade do realizador, Zack Synder, e da sua equipa em transpor Watchman para o cinema. Porém, parece-me que as diferenças entre ambas as obras não podem ser desligadas da indústria de entretenimento que é Hollywood, nem das limitações técnicas do cinema em relação ao formato original (e vice-versa).
    O ponto que irei aprofundar, embora de maneira sucinta, trata-se da forma como a violência é tratada em ambas as obras. No livro, a violência está espalhada por todo o lado, não só quando a acção envolve confrontos físicos, mas também nas relações humanas. Podemos encontrar violência no amor, se observarmos a relação que Laurie tem com a sua mãe ou com Jon, encontramo-la no alheamento de Dr. Manhattan tem em relação à vida humana, ou ainda na relação entre o psicólogo e a sua esposa. Por outro lado, embora estas relações – excepto a relação do psicólogo, que é inexistente no filme –, e outras, surjam no filme, têm um papel muito menos preponderante. A violência física, no entanto, é amplamente explorada, merecendo cenas relativamente longas de lutas com os efeitos espectaculares que temos vindo a ser habituados.
    O próprio início do filme, onde vemos o assassinato de Comedian, é uma cena violenta e relativamente longa, tratando-se de uma luta que não é explorada desta maneira na BD. Outro problema que se coloca, logo aqui – e que se repete no filme –, é da existência de diálogos que desvendam factos que, no livro, só muito mais tarde nos é dado a conhecer. Os flashbacks deste assassinato, que vão surgindo no livro ao longo do desenrolar da acção, não existem no filme – já sabemos porque já vimos a sua morte nos primeiros minutos do filme, não vale a pena repetir. É um contraste com o livro, que começa com o diário de Rorschach e uma visão de cima para baixo do crachá ensanguentado de Comedian caído junto a uma sarjeta – um início muito mais enigmático e que se nos vai desvendando ao longo de muitas páginas.
    Ao longo do filme, outras cenas de violência são exageradas em relação à obra original. A presença de Dr. Manhattan no Vietname, fulminando soldados norte-vietnamitas, é algo que não surge no papel. Na tentativa de assalto a Laurie e Dan, o filme mostra-nos uma longa sequência de artes marciais e o uso de armas de fogo, o mesmo acontecendo na detenção de Rorschach pela polícia, na sua libertação da prisão e nas cenas finais em Karnak, na mansão-sede de Adrian Veidt. No filme, Laurie também escapa violentamente ao agente do FBI – em vez de passar a ser ignorada e expulsa da sua casa – e o relato gráfico de Rorschach sobre a sua transformação acaba por deformar as suas visões no próprio teste psicológico que lhe dá o nome.
    Aliás, a análise psicológica de Rorschach é descurada no filme. No original, temos acesso a documentos sobre a sua infância, os pensamentos do psicólogo que o acompanha na prisão e vemos cenas da sua relação com a sua mãe, que era violenta, e como isso influenciará a sua relação com mulheres ao longo da acção, nomeadamente com Laurie e com a sua senhoria.

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    1. (parte 2)
      O uso destas cenas de artes marciais e a predominância da violência transforma as personagens mais em super-heróis e menos em humanos. Isso é precisamente o contrário do que se passa na obra de Moore, onde os super-heróis são humanos e têm problemas humanos, alguns bastante banais, como as dificuldades com o amor, a tentativa de megalomania ou os problemas psicológicos devidos a uma infância e juventude de maus-tratos, outros bem piores e considerados crimes – ainda que relativizados –, como a violação sexual.
      A espectacularidade da violência acaba por a banalizar, algo comum em parte da cinematografia comercial americana. Por outro lado, o amor e as relações humanas são descurados ao ponto de pouco restar da relação de Laurie e Dan no fim do enredo ou da tremendamente humana discussão, pelo menos nas conclusões, de Laurie e Jon em Marte. Esse, que é, no meu entender, um dos momentos altos da novela gráfica, perde toda a intensidade e profundidade quando é apresentada neste filme.
      A própria destruição de Nova Iorque (e, no filme, de outras cidades, como Moscovo) é muitíssimo diferente, até porque as causas são diferentes. A devastação, no filme, afecta as pessoas e os prédios, no livro, trata-se da aniquilação do ser humano, criando aquelas terríveis (e mais fortes) paisagens urbanas intactas cheias de cadáveres.
      A própria adaptação de «Tales of the Black Freighter», uma banda-desenhada que acompanha a história de Watchman, transformada em desenho animado, torna a violência, o sangue e as cenas mais violentas, perdendo uma boa parte do denso texto da versão escrita.
      Naturalmente, o tempo das 414 páginas do livro é muito maior do que as três horas e meia do filme, na sua versão final. Apesar de ser um filme longo, não cabe lá tudo e, por isso, uma adaptação seria sempre o processo normal, mas as escolhas acabam por preferir o espectáculo em detrimento das ideias e da crítica política e social que se encontra na obra de Moore e Gibbons. Todas as camadas que nos permitem descobrir as complexas relações das personagens são muito simplificadas e pouco aprofundadas no filme.

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    2. (parte 3 - peço desculpa pelo tamanho, entusiasmei-me)
      Por fim, três escolhas de ordem estética que também são duvidosas. Em primeiro lugar, o livro segue um esquema de cores com muitos amarelos, verdes, roxos, azuis e brancos, no entanto, o filme é escuro e cinzento, reproduzindo os clichés dum filme de detectives, em vez de seguir a multiplicidade de ambientes cromáticos, que podem ser antagónicos e ocorrerem no mesmo cenário. Ainda, os cigarros e o fumo do tabaco, muito presentes na banda desenhada, acabam por ter uma presença residual, provavelmente para cumprir as actuais normas (ou um certo e acrítico «bom-senso») anti-tabagistas, tratando-se de um filme de 2009. Não deixa de ser curioso que toda a violência é permitida, mas o tabaco é praticamente proibido. Para terminar, é importante referir o aparecimento de um novo elemento que não existia: o som. Ora, embora o som seja inevitável no cinema actual, e deixando de lado o debate sobre os efeitos sonoros dados a determinados acontecimentos ou a determinadas vozes, o que parece ter sido feito com pouco cuidado foi a escolha da banda sonora. É verdade que a escolha de «The Times They Are A-Changin'» de Bob Dylan para os créditos iniciais é (talvez demasiado) óbvia, mas outras escolhas deixam duvidas maiores, como a utilização de «The Sound of Silence» de Simon & Garfunkel para o funeral de Comedian (uma relação forçada), da «Cavalgada das Valquírias» de Wagner nos bombardeamentos no Vietname (uma ligação escusada com o Appocalypse Now de Coppola), de «Hallelujah» de Leonard Cohen para a cena de amor entre Laurie e Dan (uma das canções mais utilizadas no cinema e na televisão, aqui talvez utilizada como sinalização de uma espécie de milagre) e de «All Along the Watchtower» de Hendrix na aterrarem da nave de Nite Owl (contrastando mal com toda aquela paisagem branca da neve).
      Infelizmente, o filme parece uma oportunidade perdida de adaptar Watchman porque nem cria algo de novo, onde até poderia romper com a obra original, nem faz uma boa cópia.

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  6. Após a leitura da graphic novel e o visionamento do filme gostaria de elaborar algumas considerações relativamente às diferenças que me pareceram mais gritantes entre ambas as obras e que, na minha opinião, mais contribuem para a grande distância que existe entre ambas.
    Apesar de se tratar do mesmo “assunto”, considero que o filme apresenta uma versão excessivamente plana e simplificada da história em vários aspectos, fazendo com que a mesma perca muita da sua complexidade em muitos momentos. O filme mostra, contrariamente à graphic novel, apenas mais uma história de (super-)heróis e passam-lhe ao lado muitas das problemáticas que são levantadas ao longo da narrativa no original. Estas problemáticas parecem ser substituídas por uma violência hiperbólica e desnecessária, cuja única função é tornar o filme mais sensacionalista e talvez mais apelativo para um público-alvo específico.
    Alguns momentos da narrativa foram alterados no filme e, na minha opinião, não contribuem para a criação de uma imagem correspondente à que figura no original, nem mesmo tendo em conta as adaptações (/alterações) necessárias para o melhor funcionamento no cinema. Um exemplo do que estou a dizer surge com a personagem de Rorschach, que no filme perde muita da sua profundidade e subtileza para passar a ser mostrado quase como um selvagem sanguinário. Na cena do seu primeiro confronto com um criminoso (que raptou e matou uma criança e a deu como alimento aos seus cães), Rorschach procede à destruição do crânio do criminoso, numa cena extremamente violenta. No original, a cena dá-se de forma diferente e mais rica na construção deste personagem: Rorschach algema o criminoso e oferece-lhe uma serra com que se libertar, mas antes de abandonar o edifício provoca um incêndio que condenará o criminoso à morte. Este cenário cria em Rorschach uma mente mais complexa do que a que é mostrada no filme.
    Referi anteriormente que algumas questões de maior complexidade foram menos bem conseguidas. A cena em que Dr. Manhattan está em Marte é um bom exemplo. No original, além de providenciar o background do super-herói, esta sequência mostra ao leitor a forma como Dr. Manhattan assimila o tempo, enquanto no filme o grande foco é o background da personagem. A graphic novel constrói em primeiro lugar a linha temporal desde o incidente até ao momento presente, em que Manhattan se encontra ausente da Terra. Depois, há uma espécie de quebra na continuidade, dada por um saltitar entre momentos cronológicos diferentes que se vão intercalando. É como uma sobreposição de várias linhas temporais, nunca deixando o leitor esquecer-se de que Manhattan assiste a toda essa sobreposição desde o presente, em Marte, ora através do texto, ora através de imagens do presente inseridas entre os outros momentos do passado. A experiência da leitura desta sequência é altamente desgastante e permite a compreensão da perspectiva de Dr. Manhattan, que será crucial para a história no futuro. Este aspecto só é abordado mais à frente, quando Manhattan e Laurie discutem o futuro do planeta Terra, mas mais uma vez o foco não está neste tema complexo mas sim a backstory de Laurie.
    Espero através destes dois exemplos ter mostrado a supremacia da ficção no filme e a forma como outros temas são subdesenvolvidos em favor da progressão da narrativa.

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